quinta-feira, 24 de janeiro de 2013

Insônia - Texto da Antologia Um dia em minha cidade




                    A noite se deita dentro de uma sutil leveza escondendo o peso das expectativas dos dias, semanas e anos seguintes,  É o que posso expressar no sentir do passar das horas, minutos e segundos.
Ouço os ruídos em som alterado. Todo ruido, por menor que seja, é interpretado como possível ameaça! É hora da solidão vestida de madrugada. E o que significa a presença dessa senhora quando não conseguimos dormir?
                    Ouço o barulhinho irritante de um mosquito que parece preso entre os lençóis na cabeceira da cama. Depois de xingar, sacudi-los com força, liberto o inseto e constato que ele não saia dali porque estava preso. Foi a primeira vez que senti pena de um mosquito!
                    Há um zumbido em meus ouvidos que pulsam como se o coração estivesse dentro de cada um deles. É a percepção do silêncio que se faz como um véu derramando-se sutilmente na escuridão dessa fatia de Terra que se faz noite, testemunhada pela lua. Poderia ser um momento para meditação ou para uma prece. Podia ser um momento para leitura e para escrever algo como o faço agora, mas daqui a pouco sei que estarei com a mente exausta, dolorida e com aquela irritação própria das pessoas insones.
                    Não posso negar que é hora de dormir, mas que a solidão vestida de medo machuca minha alma e por isto não consigo confiar nos dias que virão. Todos serão dias sem ninguém por perto.
Como uma criança sem seio para mamar. Perdida no meio da multidão procurando pela mãe. Como uma mulher sem amante para aquecer seu corpo. Como pássaro sem ninho ou como animal que perdeu o contato com seu grupo.
                     Fico pensando em quantos companheiros de insônia moram dentro dos prédios das grandes cidades... Quantos estão assistindo TV, mordiscando qualquer coisa na cozinha. Abrindo e fechando geladeira...
                    A cidade a estas horas está cheia de mendigos que dormem. E parece que dormem bem, com toda a ameaça dos incendiários que rondam seus corpos cansados, doentes e sujos. Será que existem mendigos que sofrem de insonia? Muitos dormem anestesiados pelo álcool com total falta de perspectiva para seu dia seguinte.
                    Será que os políticos conseguem dormir? Ou dormem à custa de remédio tarja preta? Difícil dormir quando roubam milhares de brasileiros...
Há uma mãe caindo no sono para ficar com o filho que insiste em brincar no meio da noite. E o marido que trabalha à noite e não vem para casa lhe fazer companhia.
Há movimento da natureza que descongela nos polos e aumenta o volume dos oceanos comprometendo a vida no planeta.
                    Não muito longe a guerra dos traficantes entre si e com policia, a guerra do Iraque, Palestina, Israel...
                    Se a quietude  da paz lubricasse as cordas do meu coração como o azeite nas cordas dos relógios  eu estaria entregue nos braços da Confiança e certamente dormindo apesar do barulho de dentro e de fora... Se eu pudesse...

quinta-feira, 17 de janeiro de 2013

Um dia em minha cidade - Ein tag in meiner stadt - Um día en mi cidad












Maria J Fortuna

                   Rosane Zanini é arquiteta escritora e poetisa, que vive na Suíça. Especialista em Desenho Urbano na Universidade Stuttgard na Alemanha, e realizando seu Mestrado em Arquitetura e Arte na Escola Superior de Arte em Berlim, defendeu tese de Doutorado em Planejamento Urbano e Regional na Universidade Tecnológica de Berlim. Além de detentora de vários prêmios em literatura, sua poesia penetra-me e   transporta, com grandes asas, pelas cidades desse mundo afora... Haja vista aquela em que foi classificada em1º lugar na categoria "Poesia in portoghese," Itália, 2007, vertida em alemão, que finaliza assim: "Sua voz, um desencontro/saudades dores desejos, uma cidade de insônia/um definitivo adeus. Sim, a cidade de insônia bem conheço... em veladas noites sofro há anos desse mal, que por outro lado, acaba sendo a favor dos textos que elaboro, através do intenso revelar da alma no correr das madrugadas.
                    Pois bem, pertencendo à REBRA (Rede de Escritoras Brasileiras),da qual faz parte, Rosane visitou Artes e artes em 2008.  Daí surgiram honrosos convites para que eu participasse das Antologias que vem publicando ao longo desses últimos anos, como A cidade em nós (Die stadt in uns), com prólogo de Olga Lúcia Obando.
Escrevi sobre São Luís do Maranhão, minha terra natal. Fiquei muito feliz porque  havia, nessa Antologia,  textos de outros bons autores em espanhol e inglês. Tais como Rolando Salas Cabrera, Goulart Gomes, Rosane Zanini e outros.
Nessa segunda Antologia Um dia em minha cidade, participei com uma crônica que chamei de Insônia. O texto foi traduzido para o alemão e eu fiquei muito feliz por isso. Por tornar-me conhecida nos países que falam esta língua.
          Como diz a escritora e prefaciadora Olga Lúcia Obando, Rosane Zanini convoca autores de diversos países do mundo para publicar seus textos poéticos, o que resulta num trabalho riquíssimo além dos limites geográficos, dentro de uma ótica fenomenológica que traz de três continentes: América Latina, América do Norte e Europa. Sentimos, então, a unidade de sentimentos e emoções em todos os cantos do mundo. expressos em prosa e verso. Como arquiteta, Rosane preocupa-se com desenho e planejamento urbano. Como escritora, ela sente a cidade interna de cada um.
      Sabiamente e com muita arte, Rosane Zanini  nos traz, nessa experiência holística, a oportunidade de intercâmbio e enriquecimento dos escritores que habitam nosso maltratado planeta azul.
    Como disse nosso Oscar Niemeyer “ A gente precisa sentir que a vida é importante, que é preciso haver fantasia para poder viver um pouco melhor”.




sexta-feira, 4 de janeiro de 2013

O motorista e o Exu


ImageO motorista do táxi estava nervosíssimo! Resmungava o tempo todo e fazia sinais estranhos com as mãos, chamando atenção dos transeuntes nas paradas forçadas dos engarrafamentos. Tranquilamente, eu lhe indaguei:
– Aconteceu alguma coisa que lhe tirou do sério, senhor?
– Dona, tudo o que quero é sair desse estado de Exu, em que estou há seis meses. Minha mãe de santo sempre fala com os outro: - Cuidado que ele agora tá com Exu!
– E o senhor vai passar seis meses com essa entidade?
– Pois é, senhora, seis meses! Ninguém pode me olhá torto que é um perigo! Posso até mandá bala!
Aí eu fiquei tensa. Cruz Credo! O que faço agora? Peço pra ele dar uma paradinha, pago a bandeirada, desço do táxi ou sigo? Perguntei a mim mesma.
Passaram-me a informação que Exu tem parte com o demo, personifica algo negativo e terrível! Para alguns se trata do próprio, mas para aliviar meus próprios receios, lembrei-me de minha amiga Jacqueline, Deus a tenha, estudiosa em religiões africanas, que na já distante década de 70, havia me falado que aquele espirito era apenas uma energia neutra, que cumpria os mandados da mente humana. Se a mente for suja, o endereçado do trabalho, tá lascado! Mas não é pra ter medo dele, dizia ela. Então fiquei menos tensa.
– Fale-me do Exu, pedi para que ele canalizasse para uma explicação àquela estranha energia que o fazia gesticular sem parar.
– Exu é Orixá, não é espirito. Sou sacerdote dele. Com todo respeito não há culto a Orixá sem a presença do Exu. A gente tem que se entendê bem com ele, fungou profundamente o taxista. Só que ando com cabeça quente... Com isso ele fica desrespeitoso, madama.
Nossa! Pensei. Tomara que eu já saia desse túnel, desse táxi, desse Exu! Será que serei vitima de algum desrespeito até chegar ao meu destino?
– Essa noite vou acalmar o Exu, que é aquele do cemitério. Vou levar marafo, charuto e vela preta pra ele. Mas o culpado sou eu, madama, tô com o espirito vazio... isso é um perigo! Não estou cumprindo obrigação.
– Acho que o senhor tem que cumprir urgente, disse já procurando o dinheiro pra pagar a corrida.
– Vou mandar pólvora! Mando pólvora! Eles vai ver. Vão consertar as encrenca!
Fui chegando ao Parque Lage, pagando, descendo, saindo... Com todo respeito.




No Jornal Internético João do Rio, Maria J Fortuna escreve em outro estilo. Veja Crônica Carioca. Dê um pulinho lá para conhecer seu outro jeito de escrever.
 
 

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