segunda-feira, 24 de julho de 2017

A cor do anjo



Maria J Fortuna 



                    A menina, vestida de anjo, subiu ao andor de Nossa Senhora do Carmo para seguir em procissão com os fiéis.  Estava ali para cumprir uma promessa da sua tia à Virgem, pelo fato de, aos quatro anos, ter saído viva de uma hepatite das mais violentas!  Ela era muito pequena para pedir o milagre da cura, mas a tia, filha de Maria Mãe de Deus, correu para a Igreja quando soube do diagnóstico, e fez a promessa.
                    E então, tornou-se a primeira menina, naquela cidade, a usar asas de penas na procissão!  A vestimenta não era aquela clássica, de bordado casinha de abelha, como nos anos anteriores e como a maioria das meninas usavam. Seu modelo, de muito bom gosto, foi copiado da foto de alguma pintura antiga.  Cópia perfeita da roupa dos “anjos de verdade” como diziam as crianças, e que a gente costumava ver em santinhos de primeira comunhão, vindos da Europa. Aquelas asas fizeram sucesso, apesar de que a menina nem estava muito ali para elas. Roupa e asas brancas evocavam pureza e o cetim da veste brilhava á luz das velas que as mulheres carregavam nas mãos, cercando o andor em que estava a imagem da Virgem que vinha, por sua vez,  rodeada por anjinhos.  Na cabeça, um estilo novo de diadema.  Em vez de florinhas tecidas de pano e enroladas em arame, eram feitas de folhas brancas longas e acetinadas.
                    A tia havia conversado com a catequista da Igreja para que a sobrinha seguisse bem na frente do andor, armado sobre uma carroça, de forma que exibisse a grande novidade: asas de penas! Enquanto outras meninas traziam nas costas asas de papel celofane ou crepom brancas, azuis ou rosas. Eram as cores dos anjos. Algumas eram confeccionadas em arminho, tingido ou não, que tornavam as crianças mais etéreas e fofinhas.
                    A procissão seguia mergulhada em doce cheiro de angélicas com incenso. Parecia, para a menina, que ela estava pertinho do céu! Como era pequena para a idade e trazia os cabelos cacheados, muita gente já a chamava de anjinho no dia a dia.   Naquele momento, sentia-se como se de fato não pertencesse à Terra. Dali a pouco começaram os hinos... E o andor da santa com seus anjinhos, empurrado por homens da Congregação do Carmo, começou a se movimentar.

                   - Com minha Mãe estarei, na santa glória um dia,
                    Junto á Virgem Maria, no céu triunfarei!
                    No céu, no céu, com minha mãe estarei, no céu,
                    No céu, com minha Mãe estarei! ”

                     Cantavam as desafinadas senhoras devotas vestidas de branco, algumas cheirando a naftalina, com seus véus brancos e outros pretos, cobrindo-lhes a cabeça. Algumas traziam além da vela, o Missal nas mãos.
                    De repente, o carro que carregava o andor parou! Era um anjinho retardatário que vinha chegando.... As crianças mudas, na expectativa...  Ali viria um anjo vestido de qual das três cores tradicionais?  Será que também tinha asas de penas? Como seria a roupa?  Com ou sem estrelinhas salpicadas? E o diadema...
                    O pai da criança a ergueu nos braços e a colocou, bem pertinho da menina vestida com a roupa da promessa. Imaginem!  Era um anjinho vestido de verde! As meninas olharam assombradas para a menininha com aquela veste cor de abacate dissolvido em leite. Verde clarinho, transparente, jogada por cima do forro de cetim verde um pouquinho mais escuro, como folha madura. Que anjinho diferente!  Mas anjo pode vestir roupa verde? Mas claro que sim. Aquele não estava lá?  A menina de asas de pena desejou ardentemente ter uma roupa de anjo cor de folha...  E pensou, esquecendo do sucesso de suas asas de pena:

                     - Queria tanto que tia fizesse promessa de me vestir de anjo verde na próxima procissão...


sexta-feira, 7 de julho de 2017

O livro de João Bosco
 
Maria J Fortuna
 
 


                    Hoje acabei de ler "POR DENTRO DA TORRE", memórias de um controlador de  voo, de autoria de João Bosco Rocha. Para mim, foi uma agradável surpresa saber que o silencioso e querido amigo de outros tempos, é autor de um assunto que desperta tanta curiosidade quanto ao que se passa dentro daquela elevada Torre de uma só coluna. Quando menina, eu ficava embrulhada em meus pensamentos, interrogando como se subia ali. Havia um mistério naquele cogumelo gigante que diziam estar repleto de homenzinhos e  a dúvida do que eles faziam ali. Mais tarde fiquei ciente da importância dos controladores. Após a leitura do livro, uma luz se acendeu na velha Torre da minha memória!
                    A leitura de "POR DENTRO DA TORRE é por demais agradável desde que João Bosco procurou aproximar o texto da compreensão dos leigos. Afinal ele é psicólogo.  Escreve com linguagem clara, divertida e cheia de informações. Além das remotas lembranças daqueles “anos de chumbo” cuja política de esquerda discriminava militares, sendo o mesmo um deles, pertencente a Aeronáutica.
                  Acho que está na memória do povo a colisão da aeronave Legacy com o avião da Gol em 1907, bem como o caso do misterioso voo 447 da Air France, entre outros acidentes aéreos. Por que lembrar dos controladores só quando há acidentes?  Poucos tem noção da seriedade do trabalho, da responsabilidade que cada um daqueles profissionais deve ter no exercício da profissão. Poucos sabem o que se passa por dentro da Torre, onde é controlado o tráfego das aeronaves.  João Bosco escreve como profundo conhecedor do assunto, pois exerceu esta função durante muito tempo, e mesmo aposentado, continua apaixonado pelos “pássaros gigantes, ” os quais sempre cuidou que partissem e chegassem bem aos aeroportos durante o exercício de sua profissão.  Ele exerceu essa atividade antes de surgirem novas tecnologias, quando era importante que os aviões fossem pilotados “na mão”, como diz em seu livro. E ressalta os resultados do bom relacionamento e comunicação entre Controlador e Piloto das aeronaves. Presta assim grande favor aos seus colegas, aos demais profissionais do setor aéreo e a nós todos que viajamos nessas máquinas voadoras durante boa parte de nossas vidas. Publicando essas memórias, João Bosco valoriza os que no dia a dia, noite a noite, estão com os olhos pregados nos computadores, muitas vezes em stress, exercendo essa atividade.          
                     Em 2013,  foi realizada uma pesquisa que mostrou que os controladores de tráfego aéreo estão na oitava posição do ranking das profissões mais estressantes da América, como  consequência de erro, pressão, stress e o salário atual.  É de muita importância que esses profissionais, que parecem invisíveis, apareçam merecendo todo nosso reconhecimento.
                    Além disso, o livro é repleto de boas histórias! João Bosco nos apresenta uma enorme gama de pessoas dos mais diversos tipos de caráter, que conviveram com ele durante sua permanência na Torre. O leitor fica preso ao relato e desfile dessas personagens interessantíssimas! E finalmente ele nos faz conhecer sua própria história amorosa.
                    Na verdade, amei este livro e recomendo para todos os que voam por   esse mundo afora.

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