sexta-feira, 28 de maio de 2010

Corina




Maria J Fortuna

Assim era Corina... A beleza personificada numa criatura pequena, mestiça, com ar de doçura e olhar de passarinho! Talvez eu não venha mais encontrar, neste mundo tão conflituoso, a bondade tão presente e corporificada como naquela criaturinha linda! Era como se nela eu visse, de repente, a imagem de uma pomba ao se banhar no lago, ou um cordeirinho recém nascido ensaiando ficar de pé..
Posso dizer que aquele olhar de bondade associou-se ao da minha mãe. Eram as duas transadas na mesma energia de pureza. Assemelhavam-se a duas angélicas, flores perfumadas que as noivas da minha família levavam nos braços, quando se casavam. Não há dúvida de que pertenciam ao mesmo buquê. Ao pensar nelas, remeto-me ao momento em que a gente, em casa , rezava o terço à Virgem Maria. As duas tinham olhos da mesma natureza que a pureza das águas do riacho, onde as lavadeiras, entre espumas, cânticos e risos, esfregavam as roupas, como se brincassem o tempo todo, e as quaravam ao sol, para deixá-las bem branquinhas. Ou seja, elas eram especiais, com certeza!
Minha mãe foi acolhida por Corina, desde o dia em que ela tomou seu destino, casando-se com Vicente, um marceneiro, que trabalhava sob uma puxada, que vinha do banheiro, no andar de baixo. Lá os pequenos jabutis caminhavam até um pequeno tanque, rente ao chão, que formava uma camada de lodo, perigoso para quem caminhava descalço por ali. As carambolas, que caiam pelo chão, bicadas pelas aves de várias espécies, ofereciam-se aos que chegavam àquele reduto encantado. Era S.Luis do Maranhão, na década de 1920.
Sei também que Corina tinha um baú em casa, onde guardava os vestidinhos da minha mãe menina, quando se refugiava em seu lar. Afinal, minha avó precisava dar atenção a mais 11 filhos e, por causa da fragilidade de sua saúde, aquela filha precisava de atenção especial. Voltando a baú, que cheirava a alecrim, além das roupinhas e dos chinelos, havia uma boneca cuidadosamente vestida de branco bordado. Como não tinha filhos, a alegria de Corina era levar Dedé - assim era chamada minha mãe - para passar uns dias com ela. Mais consigo que com Vicente, cujo trabalho na carpintaria não era nada a favor de suas crises de asma. As duas brincavam de costurar roupinhas, fazer bordados e sequilhos na cozinha para “visitas”, que iriam chegar. Creio que nessa brincadeira, elas nem percebiam a presença dos anjos, que adoravam curtir a alegria que vinha de seus corações.
Dedé começou a chamar a eterna amiga bem mais velha, de Mamãe Corina e a seu marido de Papai Vicente. E assim ficou até quando eles partiram para o céu, muito tempo depois. Os dois viveram toda uma harmoniosa história de amor!
Um dia, o tal baú de Dedé chegou lá em casa. Não sei por que Corina se desvencilhou dele. Talvez para levar boas lembranças a minha mãe, que nessa época, já tinha quatro filhos. Eu e minha irmã ficamos encantadas! Vestimos alguns dos vestidinhos, daqueles de cintura baixa, que nossa mãe havia vestido quando menina, como um grande privilégio. Calçamos os chinelinhos e abraçamos a boneca.
Os olhos de Mamãe Corina me encantavam! Como também seu cheiro de plantas que beiram o riacho. Um cheiro assim, que vira perfume e inebria a alma da gente. Daria quase tudo para viajar no tempo, antes do meu nascimento, para ver aqueles dois anjos brincando...

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