sexta-feira, 30 de abril de 2010

A estranheza dos primeiros anos...


Maria J Fortuna
G.Klin
O adolescer é um período de muita estranheza entre os jovens. As transformações corporais, o ganho em hormônios, o desejo de viver em grupo, a cobrança da sociedade, são fenômenos universais. Mas quem disse que com a chegada da terceira idade, este sentimento de estranheza não se repete? Há uma indiscutível semelhança entre uma e outra etapa da vida, no que concerne às transformações biológicas e sociais. Nas duas vivências, medo, insegurança e enfrentamento com o desconhecido, estão presentes numa e noutra etapa. Nas duas, há perdas e ganhos. Mas enquanto, interiormente, a sutileza é grande, no exterior a coisa se manifesta de uma forma abrupta e não há quem não veja!No adolescer, o espírito da infância ainda está muito presente. Com isto há uma que indefinição, que é observada, por alguns, em relação à pessoa que se inicia na chamada “melhor idade”. São raras as que observam o que se passa... Só quando a pessoa for agente da situação. Mas de repente, numa determinada atitude, olhe aí o transparecer do espírito da juventude, que se nega a arredar o pé. Como no caso de uma conhecida minha que, aos 61 anos, no final do seu casamento de 30, esbraveja:- Agora vou partir pra outra! Vou namorar o primeiro que aparecer!E vem a pergunta relâmpago da neta de quinze anos, que observa tudo:- Que coisa estranha a vó tá falando aí, mãe? Eu hem?É a velha paixão atemporal que ataca, quando menos se espera, gente de qualquer idade. Mais comum nos primeiros cinco anos do sexagenário. Há um clima de perplexidade e, para muitos, de não aceitação, como no caso da minha amiga. Igualzinho à adolescente que não quer crescer... Realmente a pessoa não se dá conta, tão rapidamente, de algo tão novo em sua vida. O normal é protestar: este não é meu corpo, porque não corresponde ao que sinto.Bobagem ficar enaltecendo a mocidade para o adolescente e a velhice para a pessoa madura. Nas duas, além de inevitáveis, o mesmo sentimento de estranheza habita os dois corpos.

sexta-feira, 23 de abril de 2010

Uma viagem em textos luminosos

http://precesemcaledoscpio.blogspot.com/

Na paixão, todos somos crianças


Maria J Fortuna



“Não interessa a idade, todos nós somos imaturos quando nos apaixonamos...” Disse minha amiga carioca quando fomos almoçar fora, no domingo. Explodi em gargalhada, porque na verdade nunca vi uma afirmativa tão exata! Fiz uma retrospectiva dos meus dias passados e cheguei à conclusão de que até hoje, nem eu nem ninguém que conheço, escapou disto!A paixão é algo, tipo um alucinógeno com efeito anestésico de curto prazo, que penetra nas veias e encharca o coração de um jeito morrinhoso , insistente, como a dor que lateja sem remédio. Ou como um dilúvio fora de controle. Aí amigos, com licença da má palavra: - Fudeu! Foi assim que minha amiga se expressou. E é verdade! Daí vem o rosário de babaquices, que carrega nossos dias de gestos impensados e pensamentos mal passados, que estouram como pipoca e não nos deixam mais em paz. Cruz credo! Tenho pena de quem está vivendo esta situação, pois a anestesia passa e a dor triplica, depois que o ímpeto de agarrar o outro com unhas e dentes, vai parecendo inútil Haja sofrimento! O apaixonado se dá conta de que a corda arrebentou pro seu lado - o mais vulnerável. Como? Percebendo que seu arrebatador e sufocante sentimento é unilateral... Não correspondido. Aí temos dias, meses, até anos para fechar a ferida.E quando o objeto de afeto e veneração, buscando fortalecer seu ego, resolve jogar com o apaixonado? Tragédia total! De posse do amargurado sentimento de rejeição do outro, começa o projetar dos raios da sedução de quem não quer, mas não larga de jeito nenhum. E haja promessas veladas... Esperança de que um dia possa ser...“ Eu ainda não sei... Vou sondar meus sentimentos... Bem, sabe como é, ainda não esqueci fulano... Vamos dar um tempo..."Daí por diante.Tem aquela outra situação em que o sedutor jura que não percebeu que estava despertando aquela paixão. Mesmo que o contato com o outro seja quase que diário...“ Imagine! Eu sempre a quis como amiga, não pensei que ela fosse se encantar por mim!”Às vezes é muito sutil a fronteira entre a amizade e o despertar da paixão, que realmente não tem idade. Acabei de presenciar uma amiga de 64 anos brigar apaixonadamente com seu namorado de 75, de uma forma tão calorosa, que desconheci aquela criatura com quem convivi durante anos consecutivos e julgava incapaz de se levada por aquele tipo de sentimento... Outra amiga de 62 me ligou desesperada, porque seu namorado de 60 a havia trocado por certa baianinha de 30 e poucos... Pode? Sim, pode. Foi o que presenciei. E se eu vasculhar meu interior, sei que não estou absolutamente livre desta paixão que queima a alma, até meus dias finais.Bem, um dia li numa carta que Chalita escreveu para seu amigo Padre Fábio, em Cartas entre amigos, a respeito do amor. Dizia a missiva que Vinicius, naqueles versos que muita gente sabe de cor : “que não seja imortal posto que é chama, mas que seja infinito enquanto dure”, não falava de amor, mas de paixão. Concordo com Chalita. Mas será que somos realmente capazes de amar a dois sem descambar para a paixão? Sem aquele ciúme animal, que traz a tentação de querer possuir o outro? Que nos faz fazer qualquer coisa para estar ao lado do objeto da paixão? Para mim, não existe pessoa equilibrada nesta situação. O desequilíbrio faz parte e acho, sinceramente, que o amor a dois é um sentimento que muito raro se conhece de verdade, porque me parece algo superior a nós, mortais. Ainda somos mitológicos. Ah! Como adoro aqueles deuses malucos da Grécia! E como me identifico com eles!

sexta-feira, 16 de abril de 2010

A incrível experiência de Gill Taylor





Foto de Gill Taylor
Maria J Fortuna
Passando por algumas prateleiras da livraria mais próxima, dei com a capa de um livro cujo título me chamou atenção: "A cientista que curou o próprio cérebro". Preocupada com a onda de esquecimento que assola a mim e a meus contemporâneos, fiquei curiosíssima! Depois me inteirei: Trata-se de Jill Taylor, escritora, que sofreu um derrame e perdeu as funções do lado esquerdo do cérebro. Levou oito anos para se recuperar e está completamente normal. Por coincidência, hoje, abri o site da Globo News e dei com uma entrevista dela, falando sobre o assunto. Vide http://globonews.globo.com/Jornalismo/GN/0,,MUL1473009-17665-314,00.html O que me impressionou, e muito, foi que a médica perdeu toda a capacidade de criar e descodificar sons e desenvolver a linguagem. Não mais retinha informações. Perdeu o significado das palavras, a vivência do passado e as aspirações do futuro. Vivia apenas o tempo presente que, naquelas circunstâncias, parecia o paraíso, pois perdendo a noção do próprio corpo, flutuava na bem-aventurança. Experimentando um profundo sentimento de paz e felicidade, teve dificuldades para, com a ajuda incansável da mãe, voltar a fazer conexões com o lado esquerdo do cérebro, que a restituiria ao mundo exterior.Andei pensando... Como deve ter sido boa a experiência de não preocupação com o futuro, nem com as nossas famosas escavações no passado, cheio de culpas e arrependimentos. Jill fala que se sentiu como pura energia e que deixou o sentimento egoísta de pertencer somente a si mesma, para interagir com outras energias, sentindo-se parte da grande família humana. Ou seja, ela conseguiu chegar ao nirvana que tanto procuramos, levada por circunstância completamente inesperada! Ela concorda que existe um lugar no cérebro que podemos acionar e sentir esta conexão. Com certeza, a nossa educação religiosa é a grande responsável pela dificuldade de autoconhecimento. Reconhecendo esta Energia, que pode ser conectada no núcleo do nosso ser, há o despertar, há a experiência da compaixão por todos os seres e a consciência de nossa limitada existência no planeta. Tudo isto foi sentido pela médica, que está plenamente recuperada. Julgo seu depoimento de enorme importância, visto que a ciência não tem maleabilidade para admitir as coisas do desconhecido.Nesta área de silêncio absoluto, está o nicho de nossa alma e a comunhão com tudo. Na meditação, podemos chegar a este sentimento de unidade.Não é à-toa que Jill Taylor levou oito anos para regressar ao mundo exterior através de circuitos, ao longo do tempo. Lá, no lado direito do cérebro estava bom demais!

domingo, 11 de abril de 2010

Noite de abril no Rio de Janeiro

Maria J Fortuna


Nesta noite de insônia fiz jornada sobre flores mortas
Coração encolhido pelo frio,batendo desacertadamente...
Vi pessoas soterradas sob toneladas de lixo e lama
No entanto uma voz interior me dizia:
- Brotarão lírios deste pantanal, acredite!
Não acreditei, mas a voz insistiu:
- Os verdadeiramente despojados,
sentirão o perfume deles,
Que tipo de flor pode nascer deste horror?
- Sementes foram lançadas, afirmou a voz
Só posso dizer que são verdes.

O bode



Maria J Fortuna



Eu tinha seis anos incompletos quando vi bode Simão pela primeira vez. Um homem com cara de bonzinho, havia amarrado a corda que ciculava o pescoço do bicho, num poste, perto da Pirâmide de Beckman, monumento que fica na Beira-mar, em São Luis do Maranhão, onde eu morava.A cara do animal sempre havia me intrigado. Ele parecia com aqueles senhores sérios, dignos de muito respeito. Ainda por cima, tinha barba como o vovô da padaria. Qualquer maltrato àquele bicho sizudo seria uma afronta, um desrespeito. Mas o olhar dele me intrigava... Parecia que queria me segredar alguma coisa...- Este bode quer fazer amizade comigo, pensava eu. Como sempre fui uma criança que se sentia muito só, achei que devia ser amiga e confidente do bode. Afinal sua liguagem se resumia num béééé, que podia dizer muita coisa, só que ninguém compreendia. Parecia o som de quem estava se queixando de alguma coisa.... Seria absurdo desrespeitar aquele bode, pensava eu. Seu jeito lento de comer capim devia ser de bicho velhinho... Bode Simão, nome dado por mim, passou a fazer parte do meu universo. Era como se ele conhecesse meus segredos e eu os dele, daquele animal quase silencioso que eu visitava todos os dias. Certa vez criei coragem e afaguei-lhe o pelo, que era ao mesmo tempo macio e áspero. A coisa estava ficando séria, porque a amizade estava se estreitando... Ele tinha um odor meio forte, mas não desagradável para mim, sua amiga. Passei a ficar muito preocupada quando chovia, porque o bode podia estar dormindo na chuva e sentindo frio, apesar do calor do nordeste.Ou alguém podia até bater nele, sendo cruel, chutando-o ou jogando-lhe pedras, como infelizmente eu assistia muitas vezes em relação aos gatos, que corriam no muro do quintal. Havia qualquer coisa de telepático na minha convivência com Simão. A gente se ligava através do pensamento e ninguém sabia o segredo de nossa comunicação.Era só o caboclo amarrar a corda do pescoço do amigão no poste que eu aparecia na janela de casa, com minha cabeça cheia de cachinhos, esperando oportunidade para me aproximar novamente do bode ancião. Aí começava o diálogo mental:- Quantos anos tu tens? indagava eu- Não sei bem, mas já estou velho... imaginava eu sua resposta.- Teu dono é bonzinho pra ti?- Às vezes... - Tu tens pai, mãe e irmãos?- Não sei por onde andam...- Se alguém te maltratar tu me falas.- Está bem... eu falo.Numa destas ocasiões, eu subi em dois barris que estavam ali jogados. Coloquei um pé num barril e outro pé no outro. E tentei me equilibrar. Mas eis que os barris estavam vazios e cada um rolou numa direção, o que me fez desequilibrar e eu caí em cheio no chão de terra. Senti a dor do tombo nos ossos da bacia e fui chorar debruçada no corpo do bode. Só pelo calorzinho daqueles pelos macios e sentindo sua respiração, fui me acalmando... Parei de chorar e limpei os olhos. A dor passou e tudo ficou bem.Olhei para o amigo, que me fitava com aqueles olhos castanhos e mansos e disse:- Obrigada, viu?- De nada, espero que fiques bem, imaginei a resposta do amigo.Num dia claro, cheio daquelas nuvens que parecem carneirinhos, saí para encontrar com o amigo. Quando cheguei percebi que ele estava solto. A corda se arrastava pelo chão. Então me aproximei curiosa e confiante em nossa intimidade. Afaguei-lhe a cabeça como sempre, conversamos um poquinho, não me lembro o que, quando ouvi a voz de minha mãe me chamando.- Fica aí e não foge, viu? disse para o bode Simão, que me olhou fundo. Começou então a dar uma espécie de ré, o que eu interpretei como timidez. Deixei pra lá, virando-me em direção à porta de entrada da minha casa. Lembro-me direitinho da enorme pancada no traseiro, que me fez cair esborrachada no chão duro, como os chifres do bode. Entre revolta e decepção, vi que o considerado então amigo, havia me traído pelas costas, e com isto veio o fim da nossa grande amizade!Troquei de mal e nunca mais conversei com ele. Marrada inesquecível!

sexta-feira, 2 de abril de 2010

Sexta feira...


Maria J Fortuna
Quando me lembro dele, meu coração silencia.A reverência é profunda. Meu corpo faz uma genuflexão e minh´alma reconhece, de pronto, sua Luz. Eu o vejo, silencioso, com sua túnica branca, suada das longas caminhadas, com os dedos cheios de calos pelo uso do martelo no oficio de carpinteiro. Suas sandálias repletas de pó e areia do deserto. Os olhos, que contemplam toda a miséria e a graça do ser humano com aquela lucidez que nos falta, quando esmagamos uma flor. Eu o vejo manso e humilde de coração, abrindo-o para o mundo, que teima em negá-lo e esquecê-lo. Mesmo assim, meu amigo Yeshua deixou-se morrer numa cruz, com os braços abertos e pregados na madeira que tanto manpulava em seu trabalho. Mas mesmo sendo sexta-feira, eu quero esquecer os maltratos que lhe fizeram. Quero enxergar mais além. Quero vê-lo ressurgindo da sepultura empoeirada, desatando nó de algum arco-iris indeciso depois da chuva, apagando nuvens da tristeza, até que se desfaçam como onda que o mar atira pelas encostas, misturando-se às demais.Quero vê-lo sorrindo, apesar da feiura do mundo.Do fanatismo, das bombas, dos pássaros presos e dos animais selvagens engaiolados. Da devastação do planeta que o Pai criou para habitação do homem... Quero-o presente em meu coração, para garimpar a bondade nos seus rios de sangue e fazê-lo pulsar na esperança. Quero ver seus cabelos soltos ao vento, fazendo-nos esquecer dos tsunamis da vida, na visão da liberdade!Tudo que quero, Senhor, é vê-lo ressuscitado, sentado à direita do Pai, lugar este que é teu, desde o princípio. Vem, Yeshua, preciso celebrar a Páscoa contigo. Saborear o pão do grão moído, como nós o somos em nossas dores, e o vinho antigo como a história de nossas mortes e ressuscitamentos. Tua visão beatífica, neste dia, me faz relembrar aquele sonho de estar contigo, desde menina, quando eu brincava de ninar e queria jogar bolinha de gude com o menino Jesus.Quero estar sempre contigo, principalmente quando tenho dúvidas que ameaçam minha fé. Quando a noite negra das minhas sextas-feiras se faz presente e eu não sei o que fazer com ela.Só através do teu amor, volto a enxergar as estrelas no meu céu interior, tão poluído, e seguir meu caminho de mãos dadas contigo.

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Sou alguem preocupado em crescer.

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