A noite se deita dentro de uma sutil leveza escondendo o peso das expectativas dos dias, semanas e anos seguintes, É o que posso expressar no sentir do passar das horas, minutos e segundos.
Ouço os ruídos em som alterado. Todo ruido, por menor que seja, é interpretado como possível ameaça! É hora da solidão vestida de madrugada. E o que significa a presença dessa senhora quando não conseguimos dormir?
Ouço o barulhinho irritante de um mosquito que parece preso entre os lençóis na cabeceira da cama. Depois de xingar, sacudi-los com força, liberto o inseto e constato que ele não saia dali porque estava preso. Foi a primeira vez que senti pena de um mosquito!
Há um zumbido em meus ouvidos que pulsam como se o coração estivesse dentro de cada um deles. É a percepção do silêncio que se faz como um véu derramando-se sutilmente na escuridão dessa fatia de Terra que se faz noite, testemunhada pela lua. Poderia ser um momento para meditação ou para uma prece. Podia ser um momento para leitura e para escrever algo como o faço agora, mas daqui a pouco sei que estarei com a mente exausta, dolorida e com aquela irritação própria das pessoas insones.
Não posso negar que é hora de dormir, mas que a solidão vestida de medo machuca minha alma e por isto não consigo confiar nos dias que virão. Todos serão dias sem ninguém por perto.
Como uma criança sem seio para mamar. Perdida no meio da multidão procurando pela mãe. Como uma mulher sem amante para aquecer seu corpo. Como pássaro sem ninho ou como animal que perdeu o contato com seu grupo.
Fico pensando em quantos companheiros de insônia moram dentro dos prédios das grandes cidades... Quantos estão assistindo TV, mordiscando qualquer coisa na cozinha. Abrindo e fechando geladeira...
A cidade a estas horas está cheia de mendigos que dormem. E parece que dormem bem, com toda a ameaça dos incendiários que rondam seus corpos cansados, doentes e sujos. Será que existem mendigos que sofrem de insonia? Muitos dormem anestesiados pelo álcool com total falta de perspectiva para seu dia seguinte.
Será que os políticos conseguem dormir? Ou dormem à custa de remédio tarja preta? Difícil dormir quando roubam milhares de brasileiros...
Há uma mãe caindo no sono para ficar com o filho que insiste em brincar no meio da noite. E o marido que trabalha à noite e não vem para casa lhe fazer companhia.
Há movimento da natureza que descongela nos polos e aumenta o volume dos oceanos comprometendo a vida no planeta.
Não muito longe a guerra dos traficantes entre si e com policia, a guerra do Iraque, Palestina, Israel...
Se a quietude da paz lubricasse as cordas do meu coração como o azeite nas cordas dos relógios eu estaria entregue nos braços da Confiança e certamente dormindo apesar do barulho de dentro e de fora... Se eu pudesse...
3 comentários:
Eliana Luppi, por email
Quão bela foi narrada sua insônia! Dá até vontade de chegar perto dela e acariciá-la.
Ficou maravilhosa esta sua crônica! Parabéns de novo, com louvor!
Beijos.
eliana
Ondas são como o beijo:
Oferecido pela pessoa amada
Deixa-nos sedentos de amor.
Mas quando frio, gelado
Deixa-nos cada vez mais finitos.
(Agamenon Troyan)
Maria do Céu, por email:
Também a da INSÔNIA. Um texto muito inspirado e coloquial. É isso que se sente quando não se dorme..(.Imagino a angústia dos insones crônicos.)
Com “inocência” você indaga se os políticos , para dormir, precisam de tarja preta......Respondo sem medo de errar; não, não e não. Dormem o sono dos justos...por paradoxal que pareça.
Sociopatas não têm angústia daí não perderem o sono....Se não o fossem, - de nascença, por constituição, e CONVICÇÃO inabalável , - teriam culpa. E assombrados, mais do que sofrerem de insônia, seriam menos perversos.
E a corrida com o motorista e seu EXÚ é um PRIMOR! De imaginação criativa, mesmo se for apenas o relato de um acontecimento real . A D O R E I !
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