Maria J Fortuna
Hoje, quando acordei, tudo que eu queria era ouvir a linguagem dos pássaros, voando no céu, celebrando a vida! Sonolenta, fechei os olhos e senti o embalo do respirar que adormentava meu corpo recém-desperto. Aquelas aves cantavam em tamanha harmonia e beleza, que tudo o que quis foi entregar-me àquele momento! Quão distante eu dos conflitos que trazem a guerra, eu me encontrava... Dei asas a imaginação... Podia fantasiar o que quisesse!
Em cada trinado das aves, lembrava-me do Allegro 3:14 de Vivaldi. Subitamente, a presença da bailarina uruguaia Graciela* aqueceu-me o pensamento. Com seus movimentos de borboleta, ela expressava como ninguém, e entre outros sentimentos, a alegria, quando se movimentava no palco, com seus saltos espetaculares! Eu me vestida de vermelho, descalça, com os cabelos revoltos, junto a ela numa nova coreografia. Saltávamos e rodopiávamos e nos elevávamos do chão como folhas ao vento, enquanto o tempo trabalhava suas nervuras roubando-lhe o verde. E a lembrança daquele bailado está, para sempre, bordada em filigrana, em minh´alma!
O tempo não existe... A velhice é fantasia que mostra, no espelho da vida, uma camada externa dos nossos corpos em erosão. Só isto. É uma forma de nos levar, folhas secas, para o outro lado da vida, sem arrependimentos. O palco está armado e eu ali, com uma recordação tão plena do que vivi naqueles tempos de ditadura militar no Brasil! Como foi bom, hoje cedinho, a realização de um sonho antigo: dançar com Graciela!
Se quisermos, em brevíssimos momentos, realizaremos outros sonhos que guardamos no baú do coração. Sobretudo, se ainda acreditamos na brincadeira do faz de conta... Coisas de amor são eternas! Amar é a chance de reencontrarmos a esperança perdida. É permitir que o rio corra livre por cima das pedras, que o falcão voe, em todas as direções e a flecha possa errar seu alvo... E às vezes, precisamos dançar a vida como diz Roger Garaudy. Assim como Rolf Gelewiski , interpretando, com o corpo, seus próprios sentimentos. Se não pudemos fazê-lo no momento, que dancemos na memória ou imaginação. De preferência, sem sapatilhas, voando como pássaros dançarinos.
As artes são notas musicais, cores do arco-íris, que compõem a sinfonia da Beleza.
Hoje acordei com os pássaros. Quero aproveitar os momentos de oásis que o deserto me traz. Saint Exupéry sentiu que o deserto é belo porque dentro dele há um poço, que ninguém vê. Quero então dormir com a revoada do por-do-sol, quando os pássaros, aos poucos, silenciam. Silêncio tão sagrado quanto Aquele cujo Nome ninguém ousa pronunciar.
* Graciela Figueroa, Integrante do grupo de Dança de Twyla Tharp, respeitadíssima nos Estados Unidos, em Nova York, Graciela optou por ficar na América do Sul e no Brasil, e dedicar seu talento exuberante à criação de um trabalho que privilegiasse o sentir humano.
3 comentários:
Eliana Luppi, por email:
De todos os seus textos esse foi para mim o mais exuberante em beleza, harmonia, paz,
alegria, cores e emoção. A verdadeira expressão Divina que você nos ofertou com ele.
Obrigada, minha amiga. A emoção chega forte. Sinto-me feliz em estar com você!
Beijo,
eliana
adorei a foto da dança. tb adoro ouvir sons de pássaros. aqui não há muitos. beijos, pedrita
Oi, Mariinha
simplemente lindo!
Não há, pois, o que falar. Apenas sentir!
sua amiga de BH,
Marina
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