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sexta-feira, 28 de outubro de 2011
Mergulho
Maria J Fortuna
Não há explicações para o mergulho. É coisa que infalivelmente acontece. A gente sente que os fatos obscurecem um olhar cansado... É hora de esticar os braços da alma e acender a luz do coração no fundo do nosso próprio oceano interior, ao nos lançarmos nas águas do desconhecido.
Foram segundos para chegar às molhas escuras... Ali, peixes horrorosos mostram suas carrancas indeléveis. Há sensação de sufoco e a respiração fica tão pequena e apertada quanto um balão murchando por falta de gás. Não há que ficar tanto tempo mergulhado naquele abismo, em que tantos dos nossos fantasmas habitam. Naquele oceano, seres de escamas douradas e prateadas aparecem para aliviar o coração do que está por vir. Ficam um pouco aqui e ali, disfarçando o medo. Quase impossível calcular que criamos aquela população de seres disformes! Estar mergulhado não só em si próprio, mas no grande inconsciente coletivo, na trilha que percorreram nossos antepassados é o que está acontecendo. Não é bem uma noite negra, mas por estarem n´água, as formas são gelatinosas e senti-las é penetrar no pesadelo. Ali tudo é possível de ser imaginado... Depende do cardápio que introjetamos nos primeiros anos de vida. Quando a gente engole, repetindo quase todo o dia, o mesmo cardápio. E por causa disso, passamos a reproduzir o que no fundo da alma não queremos e nem fomos feitos para tolerar.
Chega o momento em que percebemos uma pequena luz, quase se apagando, no coração. É preciso preservá-la. Ou morre-se de vez devorados pelo não ser que criamos. Convém sermos livres, para não deixar que o peso das nossas fantasias impeça o chegar à superfície e dar de cara com o sol, pois o bom do mergulho é o submergir.
Então começamos a jogar fora as assombrações que nos fizeram doentes. É difícil, mas tentaremos fazer isso para sobreviver. É caso de vida ou de morte! Começamos por atirar fora as falsas definições com as quais nos rotularam durante a infância. Depois descartamos as crendices e más interpretações dos livros sagrados. Despejamos no lixo nossos preconceitos e ideias pré-concebidas e tudo aquilo que nos faz esquecer nossa pequenez frente ao mistério do amor. Estamos ai prestes a eliminar muito depressa, o vampirismo da culpa, que tem cara. Enfim, resta agora desgrudar do rosto as máscaras, já sebosas, de nós mesmos. Seria o ideal. Não dá para suportar. Não dá pra avaliar por quanto tempo estavam ali, se revezando, e a gente sem coragem pra arrancá-las. É preciso nadar em direção ao sol, ou à lua, se for noite... Tem gente lunar e gente solar, cada um emerge na paisagem que comunga com as aspirações do espirito.
Não sem dificuldade, fizemos o que a pequena luz do coração nos mandou. Ficamos então mais leves. Não sem antes sentir que as sombras anômalas podem voltar. Mas, depois desse mergulho, podemos encará-las mais tranquilamente.
O mergulho faz parte de nós e não há como deixar de fazê-lo de vez em quando. Porque só assim nos resgatamos. Vestir o auto-amor, que nos faz reconhecer como somos maiores que nossos pesadelos, e o auto perdão que nos traz, em decorrência disso, sempre que necessitamos, aceitar nossa natureza incompleta.
Alguma coisa empurra-nos para cima, mas ainda estamos náufragos e frágeis, como uma borboleta saída do casulo. Apesar de que a Luz de dentro está ficando mais forte e agora entra em comunhão com a luz de fora. Isso nos faz acreditar que, mais uma vez, exorcizamos os fantasmas e voltamos a viver, mesmo sabendo que haverá outros mergulhos...
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Um comentário:
Alguma coisa empurra-nos para cima, mas ainda estamos náufragos e frágeis, como uma borboleta saída do casulo. Apesar de que a Luz de dentro está ficando mais forte e agora entra em comunhão com a luz de fora. Isso nos faz acreditar que, mais uma vez, exorcizamos os fantasmas e voltamos a viver, mesmo sabendo que haverá outros mergulhos...
Desta vez estaremos acompanhados de nossa arma maior, a Fé. bjs, amiga amada,mony
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