Caetano na TV
Maria J Fortuna
Nunca nutri muita simpatia para com
Caetano Veloso. Sempre achei que ele havia aparecido num momento em que o povo
brasileiro valorizava um bom compositor e interprete, mas que o intelectualismo
andava as soltas. Caetano se tornou um filósofo da MPB com novo colorido da
bossa nova, porque falava com aquele sotaque arrastado de baiano, o que lhe
vinha à cabeça e o povo aplaudia. Chico Anísio construiu um personagem com as
características de personalidade de Caetano exilado por subversão. O Novo
Baiano como era chamado, dizia ter saudades de Gal, de Bethania com um ar de
quem está com a cara cheia de álcool e de drogas ou, para os mais atentos,
completamente cheio de preguiça.
Trabalhando no Hospital Julia
Kubstischek, Belo Horizonte em 1967, eu ouvia todo mundo cantar, pelo menos,
uns trechos de alguma canção do baiano desgrenhado de fala mole ou do Chico.
Buarque. Foram os anos de chumbo em que
Veloso embarcou para o exílio em Londres, com aquele cabelo enorme! Era símbolo não só de liberdade como de
libertinagem. Naqueles anos de repressão a gente ficava atenta as letras de
suas canções, onde haveria uma mensagem velada de protesto contra a ditadura.
Agradava gregos e troianos, ou seja, revolucionários e hippies que estavam em
alta naquela época.
Tinha gente que dizia que eu parecia
com ele... Não pelos cabelos encaracolados, mas pela fisionomia mesmo. Rosto
retangular, olhos caídos, queixo fino e boca de coração, como dizia minha prima
Alzira.
Hoje eu o vi na TV num especial que
trazia seu nome. Logo no inicio do programa apareceram alguma de suas frases
famosas que me fizeram rir. Tipo “Não é tão mau assim ser pseudo intelectual de
miolo mole, talvez não seja propriamente pior do que ser um verdadeiro
intelectual de miolo duro” Típico do cantor baiano. Era justamente o que eu
pensava que ele era: intelectual de miolo mole... E pensando bem miolo duro também é demais! Poderia ter um
miolo ao ponto...
Caetano cabeça branca, cheio de rugas como eu,
levantando ora a perna esquerda, ora a direita, quando canta. Com aquele mesmo
jeito de menino em corpo de idoso. Parecia brincar com o tempo... Não tive
saída – estava perfeitamente identificada com ele.
Uma das coisas que o tempo faz
conosco é tornarmo-nos parecidos uns com os outros de verdade! Temos rugas em
comum, cabelos brancos, (mesmo tingidos a gente sabe que são brancos), e certos
ares de quem conhece muito bem onde está pisando, Ainda se preferir, uma
expressão de quem está brincando para dissimular o atual conjunto corporal
comprometido com ele – o tempo!
Pouco sei do Caetano de hoje. Pelo
que li em seus olhos, há algo de novo no velho que se apresenta. Talvez um
pouco de melancolia que evoca os bons tempos onde tudo de bom brotava daqueles
que caminhavam pelas artes. Um reconhecimento de que o inexorável tempo
deixou-nos ótimas lembranças que não mais se repetem. Mas nos acompanham quando
saímos de cena e de vez em quando somos convidados a retornar, como no caso de
Caetano no programa especial da TV Globo.
Na verdade ele tornou-se uma figura
simpática, para mim. Isto porque sua figura evoca aqueles bons tempos onde a
gente lutava por um ideal comum e curtia uma boa canção.
O que eu sentia de ruim em Caetano
está junto ao pacote do que não faço absoluta questão de recordar. Esta junto a
um punhado de “besteiras” que eu andei aprontando no passado... E quer ver eu
me parecia com ele mesmo...
Hoje em dia a minha indignação com as
letras e musicas que nos tem aparecido, fazem-me abençoar o passado onde aquele
homem cabeludo com roupas estranhas e aspecto de louco compunha e cantava boas
canções. Quando ouço por um instante uma
destas blasfêmias que estão sendo compostas nos dias de hoje e que encantam a
grande massa, eu digo de coração:
- Saudade do Chico... Do Vinicius, do Milton, da Nara, do Tom... Do
Caetano...
Mas como sempre ele diz e faço
questão de acreditar “Pra que mania de viver em décadas? Não vivo em décadas,
vivo na vida... Cantando eu mando a tristeza embora...
Um comentário:
òtima crônica, Mariinha... nesta você se superou... parabéns...
Norália
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