Maria J Fortuna
Está bem viva em minha memória a imagem do Dr. Djalma Marques! Magro, alto, com braços compridos e olhar bondoso, lá estava em seu consultório , que mais parecia uma oficina de artes. Meu pai dizia: "hoje é dia de ir ao Dr. Djalma". Quem estivesse doente ou indisposto em casa, preparava-se para a consulta. Minha mãe ,asmática , era sempre a primeira candidata. Depois vinha eu, que tinha surtos de bronquite, apesar de não ser asmática, e meu irmão mais velho, nascido prematuro, com saúde delicada. Em dois tempos estávamos lá. Dr. Djalma, que cheirava a naftalina e charuto cubano, estava sempre com um terno branco de casimira inglesa. Chapéu de coco pendurado num cabide ao lado de sua mesa. Após cumprimentar efusivamente todos nós, dava inicio às consultas. Um de cada vez. E começava por indagar se alguma coisa nos afligia ou algo não estava bem, por que estávamos doentes. Auscultava, apalpava e depois seguia para trás de uma parede improvisada, a fim de fazer as poções. E elas eram tiro e queda... Dr. Djalma sempre foi clínico geral e não mandava a gente procurar outros médicos para investigar ou complementar acerca de nossos males.
Não querendo generalizar, hoje em dia, apesar dos muitos “especialistas”, a simples possibilidade de ir a um médico desconhecido, causa-me pavor! Acho que não vai ser difícil encontrar pessoas que sentem a mesma coisa. Só nos cinco últimos anos “salvei” minha tia, entrada nos noventa, de um cardiologista (já escrevi muitas crônicas sobre esta figura), que prescrevia remédios para baixar a pressão, e lhe valeu um socorro de urgência, com ambulância e tudo. A empregada, cujo ginecologista dizia que ela estava muito bem, quando foi descoberto um enorme mioma uterino. A mulher quase morreu de tanta hemorragia! Uma prima, que fez plástica de abdômen e ficou com uma enorme cicatriz, que deixava os órgãos internos quase à mostra. Uma endocrinologista que, na pressa, prescreveu-me duas vezes o mesmo hormônio tireoidiano, provocando-me enorme taquicardia, e outros mais...
O que está havendo? Quem é o médico de hoje em dia? Refiro-me àquele que não conhecemos e a quem somos encaminhados numa emergência. O que significa o ser humano enfermo para este profissional? O que seria o estado psicoemocional para ele? Por um acaso olham nos olhos do cliente e cogitam em pesquisar a causa de sua doença? Tem interesse na leitura da alma humana? Na verdade não mais interpretam os sinais do corpo , de que algo não vai bem e deve ser mudado, como o faziam os médicos antigos. Não sabem interpretar os símbolos que o corpo envia. E não há discernimento para administrar um medicamento vendido pelo laboratório como eficiente, quase milagroso! Existia o médico da família, que recebia, acolhia e acompanhava as pessoas em suas dificuldades, sabendo por que tinham sido afetadas em sua saúde. Salvo honrosas exceções, atualmente temos profissionais mal preparados e mal remunerados, que correm de um hospital para outro e cobram os tubos para atender com mais cuidado o cliente particular, quando a maioria esmagadora da população não tem recursos financeiros. Atendimento de dez minutos, quando o cidadão provém das intermináveis filas do SUS. Se bem que na maioria dos casos, o paciente está desnutrido, e a fome adoece... Não seria problema apenas médico, mas do país, onde a grande população não tem recursos para sobreviver e educação para interpretar os sinais do seu corpo. No SUS nem há tempo para isto... No entanto, não justifica a incompetência, a falta de atenção, o desamor para com o próximo. Daí os inúmeros erros médicos. Seria o caso de questionar a formação profissional na Universidade?
Ah! Como tenho saudades das poções do Dr. Djalma, que decodificava nosso modo de expressar no corpo as agruras da alma... Infelizmente estamos entregues a mais um risco nesta vida cheia de riscos... De uma hora pra outra, podemos ser encaminhados a algum desses médicos e aí..
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2 comentários:
Maria, também fiquei com muitas saudades do Dr. Djalma! Seria tão bom podermos contar mais com médicos como ele... É um assunto muito delicado. Sua cronica nos leva a pensar... Aqui um pequeno trecho de um conto meu com o tema: "E aquele médico, então? Todavia tão jovem e sem experiência de vida, lhe tratara como um ninguém, um zé-ninguém! Mal olhara para ele e sentenciara seguro sobre seu estado, seu aspecto, seu destino. E preenchera o formulário com destreza e capricho e até os Xs, naquele relatório médico pré-pronto, assinalara com exatidão. Parecia orgulhoso do resultado de seu trabalho, assim como quem faz vestibular ou joga na loteria pleno de convicção." Infelizmente muitos médicos são assim e nós, suas vítimas! Beijos e tudo de bom, rosane
Que bela crônica Maria!
Essa relação de confiança nos medicos se extinguiu ou está se extinguindo. Nos transformamos em
números e possibilidades. Um descaso tão grande isso.
O médico é a primeira pessoa que
depositamos confiança na hora mais
dificil e, essa realação de temor de um lado e indiferança do outro,
transformou o medico num receitador de remédios e os pacientes num depósito de medicações.
Belo texto o teu, Parabéns!
abraço terno a ti.
daufen bach.
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