Maria J Fortuna
Há tempos eu tinha esta vontade: conhecer pessoalmente Marília Gabriela. Agora estávamos tão perto; eu na segunda fila do teatro, e ela no palco onde interpretaria, mais uma vez - Aquela Mulher - a personagem baseada em Hilary Clinton, pré- candidata à presidência dos Estados Unidos nas últimas eleições . O texto é do angolano José Eduardo Agualusa, com direção de Antônio Fagundes.
Antes de começar o espetáculo, havia me feito algumas perguntas recorrentes: será que ela vai ser tão boa no palco quanto é como entrevistadora? Bem, corajosa e versátil sei que ela é, e muito! Mas será que vai se apresentar com a mesma segurança como encara os milhões de espectadores na TV? Escolheu um monólogo... Por que monólogo? Não é esta categoria de peça teatral um desafio para um ator com muitos anos de teatro? Lembrei-me de Fernanda Montenegro, na peça Dona doida, onde ela interpretava os poemas de Adélia Prado. E Paulo Autran, em As mãos de Eurídice. Puxa, uma loucura os fatores memória e interpretação daqueles dois gigantes! No caso de Fernanda, poesia é poesia, não há jeito de omitir ou trocar uma só palavra. Mas a Gabriela escolheu o mais difícil,por quê? Numa entrevista ao Jornal do Brasil, ela responde: “monólogo é mais fácil para mim, não quero atrapalhar ninguém em cena.” Esta entrevista eu li depois do espetáculo.
A batida de Molière soou dentro de mim. Nossa, estou nervosa por ela. Lembrei-me de todas as vezes que, em exercícios de teatro, eu mergulhava na emoção e me envolvia com a personagem, e nela, eu me perdia. Mas o que me preocupava era decorar os textos. Estava ansiosa, sim, por ela. O texto de Agualusa coloca a personagem de forma solitária, com suas indagações, a cerca de si mesma e do mundo do feminino, nas vésperas de tornar-se presidente da nação mais poderosa do planeta. Bem apropriado para uma atriz que vence desafios.
A cortina abriu e eis uma Marília ofegante, sentada no palco com a cabeça baixa, roupão e cabelos em desalinho. Começou a falar com aquela voz grave que a maioria dos brasileiros conhece. Parecia, a meu ver, travar uma luta enorme consigo mesma, para deixar emergir o texto que saia às golfadas. Eu disse a meu ver...
A identificação com a personagem, tão forte quanto ela, facilitou as coisas naquele primeiro instante. A cada momento, a luz se apagava e reacendia. E ela se colocava em um lugar diferente, mas próximo a uma só poltrona daquele cenário quase nu. Encontrei em alguns momentos, a Hilary em Marilia.
Num segundo momento, ela aparece com um terninho claro, para realizar um discurso. Ali, a alma feminina deixa-se transparecer no texto de Agualusa, revelando paixão, solidão, fracasso e tudo a que nós femininos mortais estamos de certa forma mais vulneráveis. Havia humor em algumas frases. Confesso que para mim foi difícil senti-la naquele momento. Definitivamente é verdade que o drama é bem mais fácil que o humor no teatro. Fazer a sutil passagem de um para o outro num texto como o de Agualusa, requer muito suor e talento.
Num terceiro e último momento, ela aparece vestida de pássaro para maior surpresa, acho que de todos. Mais difícil ainda sentir naquela mulher guerreira por natureza, de olhar tão forte, a leveza de uma ave. E com isto, Marília encerrou sua apresentação no palco.
Depois de alguns aplausos, não muito convincentes, retirou-se.
Saí dali pensando: por que pessoas tão talentosas em um campo profissional insistem em enveredar por outros caminhos, numa exposição tão grande de sua própria figura?
2 comentários:
Minha amiga a escritora Eliane Accioly , me enviou, por email este comentário:
"QUERIDA MARIINHA,
GOSTEI MUITO DA CRÔNICA DE M.GABRIELA. SEGUI VOCÊ E ME VI LÁ. NO TEATRO.
GOSTEI MUITO DE SUA PERGUNTA FINAL _ O TEATRO DOS MONSTROS SAGRADOS, E DOS EXPERIMENTADORES.
DOU RAZÃO A VOCÊ.
BEIJOS",
http://elianeacciolypsicanalisearte.blogspot.com/
http://elianeaccioly.blogspot.com/
Mariinha querida, o ser humano tenta sempre superar a si mesmo, e muitas vezes ele acredita que consegue, ou que conseguiu, o desafio é constante, feliz daquele que consegue sempre, um grande abraço, Monica
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