Maria
J Fortuna
A alma
possui um corpo forjado por aqueles que participaram de sua formação como
pessoa. Imagino a dança dos cromossomas trazendo, em cada um, sua carga
genética que constrói o caráter dos que vem a este mundo. Gosto de pensar no
sopro divino que anima cada um em particular, sua matemática cheia de lógica, o
jogo genético que vai se delineando no ventre materno com traços que vem de tão
longe... Cada um de nós é um poema escrito pela vida. E daí a pergunta:
Quem será o próximo que está sendo preparado para vir ao nosso encontro? E o
que trará consigo e o que deixará no mundo quando se for? Ou seja:
Quem somos nós e o que deixaremos, em nosso planeta, para os que aqui estão e,
em sua partida, o que irão deixar? O que vamos acrescentar, somar?
À medida
que o tempo passa, alguns desses pensamentos suscitam várias formas de
respostas. Ou será que elas são fruto dos anos que testemunham a luta pela
sobrevivência? E do esforço por crescer na convivência com a insegurança, filha
do medo? Mas é este sentimento de insegurança que nos faz mover em busca da
luz. A vida é um paradoxo. Sinto-me na reflexão acerca de tais
pensamentos. Sei que é necessária a consciência desse apelo cósmico para
crescermos, tal como a semente rasgando o seio da terra para sentir a luz do
sol. Um apelo intrínseco à natureza humana. Ultimamente venho sentindo,
cada vez com mais intensidade, o quanto este nosso mundo é virtual! E quanto
devo ser eu mesma para que não me perca do caminho. O drama da Terra parece
palco onde se desenrola a história de amor de um temido bruxo por certa bela
fada. Por isso temos necessidade da herança deixada pelos melhores seres
humanos que viveram antes de nós. Porque sabemos que todos nós vivemos estas
polaridades.
Existimos
e passamos para os outros a experiência de vida impressa em nossos corações.
Ação e suas consequências. Percebo que há um apelo forte para reconhecer
e acolher aquele que nos referencia como pessoa. E a importância do
discernimento: ser, e não ter e parecer, para que não nos percamos no falso, na
ilusão. Coisa difícil no mundo capitalista. É como se o bem e o mal
fossem trançados pelos cabelos da vida definitivamente. Saber conviver com os
ganhos e perdas. Ter coragem mais para ganhar do que para perder... Vigiar e
orar para que os momentos amorosos não se percam por causa do medo e da negação
de si mesmo, é fundamental. À medida que o mundo proporciona às pessoas a perda
de si mesmo, mais aumenta o apelo para a busca e encontro com o nosso eu
verdadeiro.
O que
fazemos com os traços de caráter que estão impressos na alma, desde a
fecundação? E o que faremos com nossas lembranças? Se boas, é bom que
fiquem aninhadas no coração; se más, temos o ímpeto nos livrarmos delas o mais
depressa possível. Muito difícil transformar dor de mágoa em gozo de amor...
Quando a alma suga muitas tempestades e fica encharcada, há uma grande
necessidade de desaguar. Mas isto só ocorre se não nos apegamos àquela dor que,
com o tempo, torna aquelas águas insalubres. Só o pranto, às vezes, não dá para
que esvazie e dê lugar às coisas vivas, por causa do apego, porque este, como a
insegurança, é também filho do medo. Mas é preciso escoar, torcer as
mágoas como o fazemos com borra de café. Para que nos transformemos, como
aqueles grãos colhidos, amassados e triturados, mas transformados em bebida
acolhedora em sua negritude morna e gostosa. Por isto o gosto de se reinventar,
criar!
Cada um há
de encontrar suas respostas. Mas é certo que sinto que, de uns tempos pra
cá, tenho pensado muito que sou responsável, não só pelo meu próprio
crescimento, mas também pelo o do outro. É a consciência, cada vez maior de que
somos iguais em nossas diferenças. E agradecida às pessoas que
colaboraram pelo que sou. Tanto de bruxa quanto de fada, pois o sangue venoso e
arterial ocupam o mesmo corpo que se transforma a cada momento. Por isso gosto
tanto do que disse o filósofo Sartre: “Não importa o que fizeram de mim, o que
importa é o que eu faço como o que fizeram de mim!”.
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